Teatro aborda Homofobia no campo de Concentração NAZISTA

‘Os Homens do Triângulo rosa’ aborda o drama de homossexuais no campo de concentração nazista

Espetáculo será encenado neste sábado e domingo (16 e 17), no teatro Deodoro; autor Marcelo Ádams diz que homofobia mata amigos, familiares ‘e aqueles que só conhecemos por números’
Fotos/ Luciane Pires Ferreira/ Divulgação.” title=”O texto de ‘Os Homens do Triângulo Rosa’ foi premiado pela Fundação Nacional de Artes (a Funarte) | Fotos/ Luciane Pires Ferreira/ Divulgação”>O texto de ‘Os Homens do Triângulo Rosa’ foi premiado pela Fundação Nacional de Artes (a Funarte)

Jorge BarbozaO grupo porto-alegrense Teatro ao Quadrado sobe ao palco do teatro Deodoro, neste sábado (16), às 20h, para a montagem de “Os Homens do Triângulo rosa”. Abordando a perseguição aos homossexuais pelo nazismo, na Alemanha das décadas de 1930 e 1940, o espetáculo – a produção mais recente dessa prestigiada trupe gaúcha – estreou em 2014, atualmente em excursão pelo país.

“Triângulo rosa era a forma como eram chamados os prisioneiros homossexuais dos campos de concentração, porque levavam em seus uniformes a insígnia que os discriminava, considerados inferiores a todos os outros prisioneiros, como judeus, ciganos e criminosos comuns”, destacam os produtores da peça, o autor e ator Marcelo Ádams e a mulher deste, a diretora Margarida Peixoto.

Segundo eles, o texto é sobre a brutalidade dessa perseguição e o amor que surge “mesmo em condições terríveis”. A companhia Teatro do Quadrado surgiu na cena porto-alegrense em 2002, apresentando uma série de montagens cômicas, tornando-se conhecida por encenações de peças de Molière.

A montagem de “Os Homens ao Triângulo rosa” recebeu prêmio de incentivo da Fundação Nacional de Artes (a Funarte), acumulando troféus ao longo dessa carreira de dois anos: “Braskem em Cena” de melhor ator para Marcelo Ádams; “Açorianos” de melhor ator coadjuvante para Frederico Vasques e “Cena Inesquecível”, da Escola de Espectadores de Porto Alegre.

‘Os Homens do Triângulo rosa’ estreou em 2014 e desde então acumula prêmios de teatro

Fica em cartaz em Maceió até esse domingo (17), também no horário de 20h. Na segunda-feira (18), no horário das 14h às 18h, o casal Marcelo Ádams e Margarida Peixoto realiza ainda, na capital, no complexo cultural Teatro Deodoro à rua Barão de Maceió, 375, a oficina gratuita “Presença e Eloquência: Procedimentos para a Construção da Cena”.

Acompanhe a entrevista (por e-mail) com Marcelo Ádams.

Homofobia, intolerância – eis o mote desse espetáculo que estreou em 2014… Vocês são conhecidos por trabalhar um humor sarcástico em textos de Molière. Em “Os Homens do Triângulo ´rosa”, você escreve sobre um tema dramático – ainda assim, há humor nesse espetáculo?

Marcelo Ádams – Como nossa Cia Teatro ao Quadrado já atua há 14 anos, é natural que haja em nossos espetáculos uma diversificação de nossos interesses, já que também, como seres humanos e artistas, vivemos em constante transformação. Já montamos comédias farsescas, espetáculos mordazes, e neste momento de nossa trajetória resolvemos tratar de um tema mais sério, que é a perseguição nazista aos homossexuais. Isso, naturalmente, me parece que inviabiliza um tratamento cômico. Mas gosto de pensar que a vida não é um filme ou uma peça de teatro: ao lado de acontecimentos trágicos, podemos irromper em um sorriso ou até mesmo uma gargalhada. Em “Os Homens do Triângulo rosa”, certamente a abordagem do tema é densa, quase sufocante às vezes. Mas o humor irrompe, em alguns momentos de forma surpreendente, com uma palavra ou um gesto que faz com que os espectadores tenham um alívio momentâneo. Já que temos como tema do espetáculo o amor, e a convicção de que esse amor pode representar uma esperança no meio da morte e da destruição, consideramos que os eventuais momentos de leveza que perpassam o espetáculo estão ali para lembrar que a esperança é necessária e nos mantêm vivos apesar de tudo.

O que motivou a realização desse “Os Homens do Triângulo Rosa”, abordando a intolerância à homossexualidade?

Ádams – Nossa motivação para realizar esse espetáculo está diariamente sendo reafirmada pelo mundo: a violência cortante, avassaladora, que acomete os LGBTTT. Os 49 chacinados de Orlando [EUA], o rapaz assassinado em Alagoas na semana passada, a travesti assassinada aqui no Rio Grande do Sul nesta semana, e por aí vai, infelizmente. Então, não é possível motivação maior do que essa: falar desse absurdo que nos rodeia, que mata nossos amigos, familiares, e aqueles que só conhecemos por números. Não sou homossexual, mas isso não me isenta de me posicionar totalmente contra essa barbárie e intolerância. Como artista, minha maneira de contribuir é transformar essa história em teatro. Fizemos isso e percebemos, com o sucesso que obtemos desde a estreia em 2014, que há muita gente interessada em conhecer e falar sobre homofobia.

Como aconteceu o trabalho de produção do texto, que tipo de pesquisa você fez?

Ádams – O espetáculo está estruturado sobre algumas obras literárias que pesquisamos, sejam de ficção, sejam relatos históricos e biográficos. A obra de Martin Sherman, intitulada “Bent”, conheci pela primeira vez através de uma versão cinematográfica da peça, de 1996. Depois, conheci o texto, em inglês, e foi a partir daí que as coisas começaram a se movimentar com mais velocidade. Quando li a peça pela primeira vez, chorei durante a leitura, tal o impacto que me provocou. Além de Sherman, como já escrevi, li muitas coisas relacionadas, mas especificamente alguns livros sobre os triângulos rosa ajudaram na composição da dramaturgia: “Triângulo rosa: um Homossexual no Campo de Concentração nazista”, de Jean-Luc Schwab e Rudolf Brazda; “Eu, Pierre Seel, deportado Homossexual”, de Pierre Seel; “Triangle rose”, de Michel Dufrenne, Milorad Vicanovic e Christian Lerolle, e “The pink Triangle: The nazi War against Homosexuals”, de Richard Plant.

‘Como artista, minha maneira de contribuir é transformar essa história em teatro’, diz o autor e ator de ‘Os Homens do Triângulo Rosa’

A despeito de conquistas alcançadas, vivemos um momento de intransigência generalizada, especialmente de certa bancada evangélica no Congresso, espalhando-se pelas redes sociais. Aparentemente, voltamos a um cotidiano de preconceito vivido por outras gerações no passado, e isso parece que não vai desaparecer de uma hora para outra…

Ádams – Infelizmente não acredito que tenhamos voltado a esse cotidiano de preconceitos ao qual te referes: na realidade nunca saímos dele. A violência contra os LGBTTT sempre existiu, o que havia era uma pequena visibilidade e um desinteresse de falar sobre isso. Obviamente que a partir do momento em que falamos mais sobre isso, essa violência é mais conhecida, aparece mais na mídia, e por esse motivo a ideia que podemos ter é de que há mais violência agora. Atualmente, homossexuais e simpatizantes se sentem no direito e têm o dever de denunciar crimes homofóbicos, coisa que antes era varrida para baixo do tapete. E sobre a referência às bancadas evangélicas, realmente é preocupante a maneira arcaica com a qual alguns desses deputados e senadores e vereadores e quaisquer outros líderes lidam com a evolução dos costumes. Mentes retrógradas, que não admitem que a igualdade vale para todos os cidadãos, independente de religião.

O espetáculo estreou em 2014 – essa passagem por Maceió é parte de um roteiro de excursão? Por quais outras cidades vocês estão passando? Já conheciam Maceió? Grupos de teatro, dramaturgos daqui?

Ádams – Nosso espetáculo recebeu o patrocínio da Petrobras para realizar essas apresentações em Maceió e em João Pessoa, nessa primeira fase do projeto de circulação. Pretendemos, futuramente, circular por algumas outras capitais nordestinas, mas para isso dependemos de verba que deverá ser captada junto a empresas, já que contamos com aprovação da Lei Rouanet. Eu não conheço Maceió, e realmente tenho pouca informação sobre grupos e artistas locais. Por sermos um país tão grande, fica difícil para os artistas viajarem para longe de seus Estados, o que problematiza o conhecimento dos trabalhos artísticos, já que o teatro é uma arte presencial. Imagino que deva ser também uma novidade para os alagoanos conhecerem o teatro produzido em Porto Alegre. Essas possibilidades me encantam.

Atores da Cia Teatro ao Quadrado realizarão oficina destinada aos artistas locais, na segunda-feira (18)

Como funciona a oficina de teatro que vocês ministram para os atores locais – esse é outro aspecto do grupo, a formação de atores, certo?

Ádams – Paralelamente à produção de espetáculos, eu e a Margarida Peixoto, que é a diretora de “Os Homens do Triângulo rosa”, além de cofundadora comigo da Cia Teatro ao Quadrado e minha esposa, desenvolvemos a carreira de professores de teatro. A Cia Teatro ao Quadrado ministra semestralmente, em Porto Alegre, oficinas de montagem de espetáculo, com duração de quatro meses. Eu, por minha vez, sou professor da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, no curso de graduação “Teatro: Licenciatura”. A oficina que ministraremos em Maceió trará alguns elementos que trabalhamos na montagem de “Os Homens do Triângulo rosa”, além de nossa pesquisa de linguagem cênica, que desenvolvemos no Teatro ao Quadrado.

Há uma inovação na montagem que é a tradução do texto em Libras…

A acessibilidade do espetáculo a espectadores com necessidades especiais é um dos pontos que estamos desenvolvendo nessa circulação pelo Nordeste. Teremos em Maceió e em João Pessoa essa possibilidade de alcançar um público surdo, já que será feita, simultaneamente ao espetáculo, a tradução para a Língua Brasileira de Sinais (Libras). É um trabalho complexo, e muito admirável, que começa semanas antes do espetáculo, e que depende de um profissional que consiga traduzir em gestos e expressões faciais o conteúdo das falas dos atores, para facilitar o entendimento. Os espectadores surdos veem os atores sobre o palco, movimentando-se e agindo, e buscam no tradutor de Libras a referência sobre o conteúdo do texto. É um trabalho lindo.

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